
O Ser Humano move-se por PRAZER ou em DOR. As circunstâncias dos últimos dois anos encurtaram a margem de desconforto que o trabalho pode trazer para as nossas vidas, sem que isso traga consequências. Parece um mecanismo "simplista", mas é algo extremamente potente no comportamento humano.
Mas será que esta taxa "louca" de rotatividade nas empresas se deve única e exclusivamente, a fatores emocionais? Vamos ver que não. Longe disso.
As pessoas precisam, mais do que nunca, de benefícios que vão para além da remuneração. O paradigma de gestão de pessoas baseado no vencimento mensal já vinha a mostrar sinais de alarmante ineficiência na época pré-pandemia. As privações que as pessoas passaram nestes dois anos fez com que mudar de emprego já não seja o maior fator desestabilizador das suas vidas, e o impacto foi imediato: milhares de saídas, criação de muitas novas empresas. Muitas vidas foram de tal forma impactadas, que deixou de haver margem para o trabalho ser mais um fator de frustração e falta de prazer no que se faz e em como se vive. Mais do que o que se faz e quanto se ganha, são as relações que se mantêm que contam, é a valorização que gera a fidelização dos melhores ativos de cada empresa. Haverá sempre quem paga mais aos melhores profissionais, por isso eles só ficarão se quiserem mesmo ficar, e isso vai muito para além do salário.
Foi a primeira vez que os gestores se depararam com uma tão forçada alteração do modelo de trabalho. Quem lidera baseia-se na sua personalidade, nas suas competências, experiência e formação. Em nenhum momento da história foi necessário ajustar tão rapidamente os procedimentos, além de que a cadeira "como gerir numa Pandemia" não existe nas Universidades. E o tempo era um fator determinante. Era preciso alterar e alterar já. Houve ajustamentos certeiros e conquistas que estão para ficar, mas também se verificaram (em muito maior escala do que seria desejável) alterações que se revelaram desastrosas, em termos de eficiência e de valorização das pessoas e dignidade no posto de trabalho. Acima de tudo, houve linhas vermelhas que foram ultrapassadas que tornaram a employee experience insustentável. Foram atingidos pontos sem retorno em larga escala, e quem podia saiu, quem não podia continua até hoje à espera desse momento que sim, é irrevogável e vai acontecer.
A dinâmica do poder no trabalho está a mudar e quem não a compreende, não a pode acompanhar. Há diversos estudos que apontam que na maior parte do tecido empresarial em 2024, pelo menos um em seis postos de trabalho esteja por preencher. Só no setor fabril, prevê a Deloitte que em 2028, dois milhões de postos de trabalho estarão por ocupar. A escassez de mão-de-obra começa a ser um fator determinante, e a escassez de mão-de-obra altamente capacitada mais ainda. A balança do poder começa a tender para o lado dos trabalhadores, e cada vez mais quem recruta as empresas são os funcionários e não o contrário. O velho dogma do "quero, posso e mando" teve os seus tempos áureos num tempo que a estabilidade era um dado adquirido na sociedade e a procura de trabalho suplantava largamente a procura. Hoje o "jogo" mudou e os bons profissionais, aqueles que acrescentam valor, sabem que encontram trabalho e são eles que escolhem para onde vão. E eles só vão para onde lhe for garantida qualidade de vida no trabalho e maximização das suas competências.
Os fatores de retenção de talento não são respeitados. Está "tudo" a acontecer ao mesmo tempo e quem gere, muitas vezes não tem tempo para analisar e prever. Ou pior ainda, não tem consciência de que para não se deparar com uma carta de demissão dos seus melhores ativos, estes cinco fatores têm de coexistir ao mesmo tempo: gosto pelo que se faz, worklife balance, relação com os colegas, estabilidade, e relação com a chefia direta. Cumpram-se estes requisitos e está garantida a competitividade. Mas o que assiste cada vez são empresas a afastar-se cada vez mais destes requisitos. Junta-se a isso o facto da maior parte das empresas estar a crescer, e podemos visualizar de uma forma quase palpável a receita para o "desastre". É impossível enfatizar este facto suficientemente. O lado do "copo meio cheio" são as empresas que se regem por estes modelos humanistas estarem a ficar cada vez mais fortes e competitivas. À custa do "mal" de alguns, mas "quem faz a cama...deita-se nela".
Há a ideia de que cuidar das pessoas é um custo sem retorno. Quando me "brindam" com este argumento, respondo com perguntas como "quando custa substituir alguém que podia ter ficado?" ou "quando custa perder os seus melhores ativos para a concorrência?" ou ainda "quando custa por dia o trabalho de uma equipa desmotivada e desvalorizada?". E faz-se um silêncio...seguido de "certo, vamos conversar". Nunca foi tão decisivo aproveitar as competências de uma massa humana tão capacitada, ao mesmo que se criam as condições para o pleno potencial de cada um se manifestar. Nunca as pessoas precisaram tanto de ferramentas corporativas para o individual e coletivo poder singrar.
Num Mundo que muda a cada dia em todas as áreas, só vão sobreviver aqueles que forem capazes de se adaptar.
E não, não há "casos perdidos".
Se as empresas com quem colaboro conseguem, as outras também conseguem.
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